
Paula Cabrera
Bebês correndo sob tapetes de palha no chão, muitos carregados em slings, enquanto outros dormem felizes no aconchego do seio materno. Esse era o clima entre os mais de 200 participantes da palestra sobre alimentação dada no domingo (10/11) na capital pelo renomado pediatra espanhol Carlos González.
Com mais de 400 mil livros vendidos, amplo currículo acadêmico e ícone na defesa da amamentação e da criação com apego, o médico conduziu uma conversa sobre mitos na criação do bebê e disse que seguir fórmulas pode ser o combustível para errar na educação dos pequenos. "Passamos os melhores anos das nossas vidas preocupados com bobeiras: o bebê não dorme sozinho, o bebê não dorme a noite toda, o bebê chupa o dedo, o bebê não quer comer brócolis. Todas essas coisas não serão problemas em cinco anos. E, em 30 anos, serão as melhores memórias de nossas vidas", diz ele, que hoje é avô.
Durante a palestra, ele é taxativo ao colocar fim em diferentes mitos - sono do bebê, amamentação, frustação, castigos, estímulos e alimentação - todos os pitacos que as mães recebem (e todas nós recebemos em algum momento da vida) são derrubados pelo pediatra. Ele, no entanto, não aponta nenhum caminho milagroso, apenas ressalta a importância de ouvir o bebê, atendê-lo e amá-lo, respeitando seu tempo. " Somos animais sociais. Vivemos em sociedade. Devemos querer que nossos filhos vivam em sociedade. E isso significa respeitar as regras, saber como obter ajuda quando precisar e a prestar ajuda quando pedirem", diz ele.
Nas poucas vezes em que confirma sua preferência em algum comportamento, mostra dados. Quando fala sobre cama compartilhada, por exemplo, traz números que demonstram que crianças que dormem com os pais até os três anos, têm maior confiança ao dormirem em seu próprio quarto depois. "É simples. Se sei que serei bem recebido na cama dos meus pais, posso dormir tranquilamente na minha cama e correr pra deles se algo dá errado, mas se nunca consegui essa confiança de aceitação, vou sempre tentar dormir lá para não ser rechaçado na madrugada", afirma, mostrando um estudo com crianças suíças, que aumentaram as idas aos quartos dos pais entre os três e os seis anos de idade, quando, segundo o médico, começam a entender melhor as rotinas da família.
Guru da criação com apego, ele defende que os pais devem investir tempo e amor nos filhos, sem castigos ou recompensas e aceitando que birras acontecem porque os bebês ainda não têm maturidade para entender que não podem ter algo naquele momento. "O carinho nao deseduca. Os adultos são condenados quando roubam, matam e, mesmo assim, só quando vários juízes determinam isso. Mas os pais condenam quando colocamos o pé no sofá, quando não nos comportamos conforme o esperado. Isso precisa parar", diz.
Sobre alimentação saudável, o médico traz silêncio absoluto ao auditório ao dizer que é necessário mudar hábitos alimentares de toda a família para confirmar uma alimentação saudável para o bebê. "É necessário mudar a dieta de toda a família pra sempre. Nao adianta pensar que haverá diferença num adulto que comeu besteira por 30 anos e outro por 29 anos, somente porque no primeiro ano, um deles comeu legumes sem sal feitos para o bebê. É preciso ensinar seu filho não a comer de tudo, mas não comer de quase nada. Hoje come-se muito mal. É preciso cuidado na alimentação da família. No começo da vida os bebês levam tudo à boca. Se comem jornal, fio de telefone, podem comer alface, mas isso muda também. Nao faça promessas, nao faça chantagens. Deixe seu filho em paz. Que ele coma o que quer e o quanto quer. Se você insistir que ele coma algo, na adolescência, não vai mais comer, quando puder decidir. Se pizza e hambúrguer fossem colocados como menu do pediatra, na adolescência nao comeriam mais", diz ele.
Entre os dados apresentados, ele afirma que a recompensa- coma o brócolis que te dou a sobremesa- causa na criança uma ligação negativa com o alimento. "Ele vai sempre associar que brócolis é ruim. Que o bom é o doce depois. Pensem bem se vocês não tem sentimentos assim também com a comida, que trouxeram da infância", afirma ele. A quantidade também é algo para não se preocupar. "Ninguém come bem todos os dias e crianças não precisam comer tudo todos os dias. É preciso calma para aceitar quando ele não quiser comer."
Segundo o pediatra, comer hoje é uma atividade social. E a maioria dos adultos faz, no dia a dia, uma alimentação "afetiva", muito ligada às experiências da infância e com a comida "normal" apresentada nessa fase. "É preciso cuidar do que se oferece ao bebê. Se você não quer que ele coma açúcar, não ofereça pudim na sobremesa, ofereça frutas. O ideal é que apenas 10% do consumo diário do bebê seja açúcar. E, na vida adulta, a comida normal será essa ligada à infância. Que remete à boas memórias, bons momentos", conclui.
O pediatra espanhol veio à SP a convite da editora Timo, que lança seus livros no país, para uma série de palestras.
A repórter do Nossa Cidade cobriu o evento à convite do blog Maternar, da Folha de São Paulo, onde você pode encontrar mais informações sobre o encontro.